"A juventude de hoje segue o mesmo rumo da minha juventude. Apatia, ignorância, conformismo, subserviência. Não agem nem reagem, parecem ovelhas guiadas por um pastor invisível. Vez ou outra surge alguma "ovelha negra", que logo é calada. Não é tão normal ser diferente."
Hallison Liberato
Acredito que isso tem sido assim desde sempre. Na minha época já era, talvez pior. Eu era taxada constantemente de ovelha negra da família, mesmo tendo me casado aos 19 anos, imagine, uma mulher na minha cidade de interior ir pra faculdade, pensar em carreira...
Lembro-me de uma redação que fiz na escola, no Ensino Médio (Colegial na época) onde tratei desse assunto, e o professor levantou um debate sobre minhas palavras. Era um absurdo que eu colecionava livros, enquanto minhas amigas e primas colecionavam guardanapos pintados à mão para seu enxoval.
Mas a maioria de meus amigos era como eu. E hoje estão muito bem. Viver grandes momentos na vida envolve grandes riscos.
Por trabalhar com muitos, sei que nem todos os jovens de hoje são de todo ruins. Mas, como somos diferentes de nossos avós, também eles são diferentes de nós. Não podemos tratá-los como fomos tratados. E isto tem a ver com nossa ação enquanto sociedade, igreja, escola e família.
Eu vejo uma juventude hoje que é generosa e solidária. Dispõe-se a trabalhos e campanhas quando há liderança e motivação. Podemos contar com sua força no atendimento aos pobres e necessitados, e até mesmo nas passeatas e protestos.
Acredito que os jovens hoje são, também, extremamente tolerantes. Toleram pais e familiares bêbados, irmãos viciados, infidelidades conjugais, diferentes orientações sexuais. Toleram governantes injustos. O que por um lado é positivo, pois revela sua capacidade de conviver com realidades múltiplas e contraditórias. E o lado negativo é que torna a convivência extremamente desgastante, chegando ao ponto do comodismo, da apatia e da indiferença.
Outro elemento é que mesmo fragmentada há uma consciência ecológica. Estão preocupados com a vida de nosso planeta terra. E muitos se envolvem em projetos a favor da preservação e da reconstrução de toda a natureza.
A juventude está na mídia. Os meios de comunicação a venera e a idolatra. Tem uma presença garantida em todas as programações. Aliás, aparência jovem é uma meta que esta mesma mídia nos impõe. Basta observar a infinidade de produtos que querem nos fazer descer goela abaixo. A juventude é a primeira clientela-alvo do consumismo.
Por outro lado, temos uma juventude estressada. E por quê não dizer depressiva e ansiosa. A sociedade faz muitas cobranças, não lhe dá condições. Só lhe oferece um futuro de muitas inseguranças. Em época de vestibular esta realidade é mais visível. Outro fenômeno é que muitos estão na segunda ou terceira faculdade e ainda não conquistaram o seu lugar no mercado de trabalho (ou precisam disso para sobreviver).
Um outro aspecto é que gente da minha idade não tinha acesso à droga, e o mesmo não acontece com os jovens hodiernos que são assediados em praças e avenidas, escolas e clubes. Uns são heróis e resistem, enquanto que outros entram na onda, e adentram por um caminho quase sem volta.
Sexualidade é outra questão que merece atenção. São, ao nosso julgamento, prematuros e inconseqüentes. E o saldo de tantas experiências são os traumas que carregam pelo resto da vida. Na adolescência já tiveram sua primeira experiência sexual. Valores como virgindade, fidelidade praticamente não existem.
É bem a geração do "depende". Tudo é relativo. Hoje fica, amanhã não fica mais. Casa e descasa. Ordena e desordena. Assume compromisso e logo descompromete. Tudo é provisório. "Se não me faz sentir bem vou logo partindo para outra". É um desafio apresentar os valores humanos, morais e religiosos. Como apresentá-los é ainda mais difícil, uma vez que eles não acreditam nisso. E a mídia também ajuda a reforçar a libertinagem, que jamais será felicidade.
Se de um lado o jovem da classe alta recebe muito dinheiro e oportunidades, mata índio e garçom, de outro, o jovem pobre não tem dinheiro para nada. Tem que trabalhar para comer e se autossustentar. Antes de pensar em vocação, profissão ou estudos tem que pensar na sobrevivência sua e da família.
Este é o rosto, ao menos em parte, de nossa juventude: vida sexual precoce; dificuldades financeiras; na mira do traficante; geração do "depende"; sem passado nem futuro; indiferente à reflexão; de cultura superficial e já mergulhada numa salada religiosa nefasta.
Invista tempo em seus filhos
Acredito que também, para aqueles que trabalham com jovens hoje, ou são pais, o caminho é o do coração. Eles necessitam de nosso amor e carecem de nosso tempo. Por isso, que lidar com jovens pressupõe capacidade de amar. E é bom lembrar que ninguém é privado de coração, mas também é certo que poucos sabemos amar. Além do mais temos que recordar que é necessário uma proporção entre coração e cabeça, entre afeto e racionalidade. A ausência de um desumaniza e produz monstros. Quem não é capaz de amar, não atrai para o amor. E nossa juventude é pouco amada e muito cobrada. Quem gosta de ser cobrado? Ninguém.
Ela necessita de modelos, e o melhor modelo sempre será Jesus Cristo, que é o paradigma por excelência. Ele soube conjugar com sabedoria a fé e a razão, a ternura e a firmeza, a compaixão e a justiça.
Se nos deparamos com uma juventude perdida, lunática, violenta, consumista e erotizada é porque os modelos em evidência a atrai. E ficar, com saudades das lideranças que já cumpriram o seu papel, como Gandhi, Martin Luther King, Madre Tereza de Calcutá, Dulce, Betinho, e mesmo nossos líderes e profetas, pouco adiantará. Faz-se necessário, com um jeito novo, ousado e em comunidade encontrar novas soluções afetivas e efetivas para os problemas de hoje.
Receita? Não temos. Há quem diga que é "caminhando que se faz caminho". Em tempos de crise é preciso lutar contra as algemas, sonhar e construir um jeito novo de viver e conviver. Na esperança, não tenhamos medo de propor valores e desafios.
Ou vivê-los, e sermos exemplos, mesmo que sejamos parte desta juventude.